terça-feira, 24 de novembro de 2009

Auto(De)Composição.

Isso são só sílabas fugidas do oco do peito atravessando corredores de cordas e nós que não se desfazem são só partículas quebradas no inócuo da boca tropeçando lábios à fora na respiração trêmula diante de um vasto céu e de sua escuridão que não tem fim são só mensagens subliminares em código morse através do vítreo dos olhos que não calam nunca por mais que queiram são só convite para a hipnótica falta de som que compõe o silêncio na ausência de destino que as palavras têm são só idéias interrompidas interligadas sem pontos nem vírgulas ditadas pelos ecos contínuos de faces sem nomes que gravaram seus traços atrás do meu pensamento são só tentativas êfemeras esquálidas e condenáveis de dar vida ao que não tem forma são só símbolos gráficos de interpretação aberta que não têm intenção de ser mais do que são para cada qual e cada um independente de todas as coisas e contratempos que se ponham no meio. Isso são. Isso é. E ser é tudo o que me resta e não me basta porque quero sempre mais e querer mais é meu encanto e minha contradição é meu ponto-e-vírgula numa sentença interminável que levarei por toda a minha vida e enquanto houver qualquer sombra de minha existência breve e pouco pragmática então entregarei minha'lma ao sereno desassossego de que fui feita com a condição de permanecer inquieta e faminta por toda a eternidade.
- Danielle Bernardi

domingo, 22 de novembro de 2009

Sertão de Sadim.

Haverá um dia em que esse meu destino de ser eterno passageiro me levará além do alcance dos seus olhos. Haverá um dia em que minha asas de borboletas rasgadas serão minha única chance de vôo. Haverá um dia em que sairei pela porta e não terás mais notícias minhas.
Enquanto eu viver, haverá um dia para todo o caos que me aguarda. Enquanto eu viver, meu toque será o princípio da história de sadim. Entrelaçarei meus dedos à dúvida: e caminharei com ela: para todo o canto. Criarei aquarela da minha ruína: sonhando com cores que ainda estão por vir.
Haverá um dia em que minhas palavras serão o gatilho para o silêncio que me espreita. Em que a espera vai bater à minha porta: trazendo de volta todas as minhas cartas endereçadas ao vento: caindo aos meus pés como folhas secas no outono.
Haverá um dia em que a chuva se recusará a cair por mim: e minha seca se fará sertão: entre um piscar e outro.
E quando eu não puder mais sentir, haverá um segundo pelo qual tudo terá valido a pena, e vou desejar fechar os olhos e gaguejar minha respiração falha para implorar que fique. E quando, no instante seguinte, todo o resto voltar à suas órbita normal: estarei arruinada. Meu tiquetaquear será sempre essa melodia desregulada, esse ruído irreversível. E meu toque será passageiro, como um floco de neve estilhaçando-se no asfalto. Mas, estarei sempre à um sopro de distância. Despedaçando-me em gritos do lado de dentro, perecendo em silêncio do lado de fora. Veja a marca dos meus dedos na sua porta, trago a tinta do batente misturada a pele e mantenho o frio dos dedos dentro do bolso, carregando à ausência entre os seios. E quando não puder mais me ouvir: desvaneci. Integrei-me à um vento que passava e me perdi.
Haverá: enquanto eu viver: um dia.
- Danielle Bernardi

sexta-feira, 20 de novembro de 2009

Conta-gotas.

Se não posso encontrar sentido nas palavras: então que ela jorrem como for: coloco minha mecânica sobre a mesa: desmembrando-a com a ponta do dedos. E minha resposta é sempre a mesma, um jarro vazio com a sombra sonhada dos vaga-lumes que poderiam existir ali. Então que seja, deixa a chuva passar e as goteiras secarem - as rachaduras já estão feitas e o que vier: virá, quando o tempo chegar. E gosto de pensar que o tempo ainda se fará, pelas minhas mãos: e que todos os meus calos: não visíveis: definirão a forma de uma linguagem nova, em que não me faltem sílabas para traduzir o incomunicável. E se o tempo acabar, que ainda me reste uma chance à um último erro - que eu possa encontrar um mundo maior em mim: com espaço para mais. E que minhas últimas palavras estejam todas quebradas, como um pensamento interrompido: de braços abertos às possibilidades. Mas, se me for permitido desejar: quero o deslumbramento de ser arrebatada, abrupta e continuamente, por oceano infindável: e quero ser levada ao fundo e à superfície, debater-me entre as rochas e deixar o corpo entregue a maré: quero a insensatez de mergulhar em um caminho sem volta, tendo ciência de que não sei nadar. Se me for permitido desejar, quero a ousadia, a estupidez: quero o bruto da vida: o centro vital de sua natureza contraditória. E vezououtra, perder as horas brincando de exteriorizar a loucura em conta-gotas.
- Danielle Bernardi

sábado, 14 de novembro de 2009

Ícaro.

Lembre-me de encontrar leveza, por mais insustentável que ela seja. Colocarei minha frustração em sopros e desafiarei o vento. Porque meu riso é minha declaração de inpedêndencia, meu atestado de loucura - e me recuso a conter minha necessidade constante de ter o espírito insatisteito. Tenho o corpo lânguido e quebradiço: com desejo de queda-livre. Minha vida pede vertigem e minhas asas derretidas sob o sol são o truque traiçoeiro de minha essência: fidelidade lírica que me compõe. Lembre-me de encontrar leveza, por mais insustentável que ela seja.
- Danielle Bernardi

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

Redemoinho.

Bata a porta ao sair. Preciso que sua ausência faça barulho do lado de fora, antes que enolouqueça. E que os gritos dentro de mim percam a força, substituídos pelo retumbar de um motor tão falho, tão cansado. E quando os outros começarem a aparecer, vou sentir aquela mesma peça - desconectada na parte de trás da minha cabeça - comprometendo minha mecânica toda. Então vou sentar no chão, quando ninguém estiver olhando, perscrutando à mim mesma em busca de um sinal: emaranhando meus dedos nos nós que me compõe. E que não me olhem nos olhos por tempo demais, sou buraco sem volta. Deliro com fantasmas esquálidos e hematomas entre as costelas, pedindo à dor que me beije a fronte e me ponha para dormir. E quando ela não vem: minha apatia me leva. Carregada em seus braços sou ponto: sou começo: sou final. E continuo precisando ouvir sua ausência fora-do-meu-corpo. Desmembrar meus vazios em pilhas de dez centavos: construir pontes entre a impossibilidade e o róseo dos seus lábios. Venta-me com o ar dos seus pulmões: prefiro me desfazer em grãos - pousar na sua janela e encontrar descanso.
- Danielle Bernardi