quinta-feira, 30 de abril de 2009

Sonho Ruim.

Ligue o rádio para mim. E espante esse sonho ruim, por favor. Não me espere sussurrar dentre o sono, venha pegar a minha mão. Entrelace seus dedos nos meus e faça esse eco vazio ir embora. Ou me deixe só, para me abraçar com a noite e uma melodia triste. Cedo ou tarde cairei num mundo sem sonhos e então, outra vez, o dia sempre começa com todos os silêncios que eu precisava dizer - se houvesse alguém para escutar.

- Danielle Bernardi

terça-feira, 28 de abril de 2009

Vinagre e Sal.

Ei, era um dia colorido aquele, certo? Em que corríamos sem pressa contra o tempo, com nossos espíritos juvenis exaltados, gritando por liberdade. Ou era tudo um sorriso ao observar uma foto? Uma lembrança corrente com o gosto fresco perdurando nos lábios. Talvez fosse só um devaneio também, já não me lembro bem. Talvez tenha sido mais um daqueles dias em que perdi, ou que ganhei, vivendo outras vidas em um único suspiro. A gente nunca sabe, certo? Depois que perdemos o contato, toda vez que penso em você é sempre aquela mesma coisa, aquela centrífuga que tira meu eixo e gira o mundo que construí pra mim, ou que me foi construído, já não lembro disso também. Já não lembro se você desfaz meu mundo ou se me traz clareza... Para ser sincera, parece que tudo vem desaparecendo nos últimos tempos, e tudo o que sei parece misturado com sombras e ausências de certezas que um dia eu jurei ter. Aquilo tudo foi verdade, ou só minha vida quando fecho os olhos? E mesmo assim você achava algo palpável em seu passado, quando tudo o que tínhamos era um abrir e fechar de ontens com os olhos sempre abertos, prometendo um até logo. Parei de lembrar daqueles dias. Parei com muitas coisas na verdade. Sem mais sorvete de flocos em dias de chuva, ou dormir no telhado pelo menos uma vez em todo o verão. Parei com o tempo que não anda com o relógio. E parei de dizer a verdade também. Tudo o que tenho é sarcasmo. Assim, se ler algo meu um dia, faça aquela coisa de franzir a testa ou dê aquele sorriso escondido, pois não sei de qual dos dois gosto mais. Depois me amasse e me jogue no lixo, não é como se eu não tivesse feito isso antes. E durma com os anjos meu bem, enquanto se esforça para não pensar em mim e em tudo o que disse. Eu sonharei para você beijos e poesias, enquanto você rola na cama se perguntando de onde é que tirei tudo isso, e tudo o que está por vir. E quando acordar, me olhe no espelho. Eu estarei lá. Na ironia e na inocência de seus próprios olhos, ou eu deveria dizer nossos? Deixe para lá, já está ficando tarde e cedo demais. Vá sonhar com alguma coisa, ou fingir que não sonha só para ter uma razão para fechar os olhos de novo. Eu ainda estarei lá, mesmo depois que você fechar a porta com o ponto final. Nós sabemos que ainda darei as caras, nem que seja num riso breve e sem sentido, que te faça olhar mais para dentro e te mantenha em pé por mais algum tempo. Porque sem a loucura, não seremos nada. E ser normal não é para o nosso bico meu bem, nem pro bico de ninguém que te vê de verdade, e que me vê também, acenando num ímpeto incontido, num fim de texto que nunca chega. Só mais cinco minutinhos. Só mais um beijo e uma última piada. Você me tem quando quiser. E sei que ainda temos aquela juventude toda pela frente, não importa quantos anos eu aparente quando te olhar de volta. Boa noite meu bem, te vejo pela manhã. E quando você sorrir, eu sorrirei de volta.

- Danielle Bernardi

quarta-feira, 22 de abril de 2009

Sonhos Cadentes.

Haverá o dia em que as estrelas olharão por nós no mesmo instante em que estivermos olhando para elas. Até lá, ainda estaremos procurando. Segure o seu fôlego, ainda temos tempo e estrada pela frente. Ainda estarei guardando tudo em caixas para quando você chegar, ainda estarei sendo apenas metade, má-vontade. Haverá o dia em que a certeza se desmanche em lágrimas, como uma porta que abre pela primeira vez. Então nos olharemos nos olhos, e sentiremos a pulsação um do outro na palma de nossas mãos. Até lá ainda haverão vibrações e batimentos surdos. E quando finalmente olharmos as estrelas, entrelaçaremos os dedos e deitaremos na grama molhada do sereno, fitaremos o infinito e de alguma forma nos veremos nele refletidos. Naquele momento o mundo será um detalhe esquecido, um ponto no tempo deixado para trás. E não precisaremos olhar um para o outro para saber que estamos sendo observados, e não precisaremos falar para sermos sinceros. Haverá o dia, em que a noite será a eternidade, um eterno deleite da serenidade que buscamos. Até lá ainda seremos insones, corpos cansados de coração dolorido. Ainda terei as palavras que nunca disse, na ponta da língua. E sentados sob aquele mesmo céu, desejaremos que o futuro nunca chegue, e que possamos ficar presos, um ao outro naquele lugar. E a pressa não será necessária, e a saudade que nos consome permanecerá quieta, aconchegada entre o as pausas de nossa respiração. Haverá um dia em que a realidade será um filme bonito que desejamos recordar, uma história que gostaríamos de contar à nossos netos, quem sabe. E quando todas as palavras faltarem para descrever aquele momento, encontraremos os olhos um do outro e ultrapassaremos o limite da compreensão. Ate lá, as estrelas ainda estarão procurando por nós.

- Danielle Bernardi

domingo, 19 de abril de 2009

Sopro.

Porque às vezes a certeza faz falta. E tudo o que resta é um buraco enorme, sem promessa para ser preenchido. E até o vento ecoa num oco esquecido, envelhecido, dolorido. E somos todos velhos solitários, oferecendo bengalas de apoio para nossos corações, se encolhendo do frio e da esperança de sonhar de novo. E somos todos almas perdidas, cegas, batendo contra paredes, fingindo que tudo está bem. Enquanto isso o tempo passa, marcando o vazio dos dias de espera e a fumaça das alegrias que juramos ter sentido um dia. E nada nos resta, além de alimentar nossas ilusões e cogitar sonhar de novo. A dúvida assombra, alimenta, entristece, transtorna. E tudo o que queremos é a fé justificada, a causa certa, o destino concreto. Só por um momento, antes que tudo nos enlouqueça. E como a fé justificada nunca chega, nossas mãos se fecham em torno da fé cega, da esperança surda, esperando que um dia tudo bata a nossa porta. Então ficamos cansados do círculo vicioso, sem forças para parar de esperar, sem a chance ou a ousadia de se entregar ao desespero. Ficamos caídos, observando tudo girar dando um momento para a tristeza antes de nos agarramos a esperança outra vez, com ainda mais força. E somos todos velhos solitários, almas perdidas. Somos eu e meus reflexos, meus pensamentos, meus medos me encarando de volta. Somos um conjunto de estrelas e o caos completo. Somos a teimosia e a fé, agarradas fervorosamente uma a outra. Enquanto o tempo passa, enquanto a espera continua. E o vazio se torna espaço, se torna presença, se torna fardo pesado, manto invisível - segunda pele. E a batida mais forte se faz ouvir quando prendemos a respiração, retumbando até à ponta dos dedos, enchendo a sala por um instante, procurando direção antes de voltar para nós, com a fúria de uma onda que nos afoga por tempo o bastante para tentarmos outra vez. Para esperar sempre um pouco mais, um minuto que seja. E somos velhas almas, perdidas e solitárias. Sorrindo com o absurdo e sendo sempre um pouco mais tolas para continuar. Um pouco mais determinadas, um pouco mais esperançosas. Somos o grito incontido, o chamado constante. Somos eu e meus fantasmas, meus sonhos, a procura de um lugar para descansar. A procura da certeza e da dúvida, numa mesma pessoa. E a fé justificada é só uma sombra distante, que não alimenta por tempo o suficiente. E a dúvida é combustível, é transtorno. É o caminho. É a palavra e o sorriso que procuramos, numa mesma fonte. Somos eu e a esperança - a fé desesperada, gravada bem fundo em um nome que desconheço. Somos todos velhos solitários, almas perdidas, à procura de esperança, à procura do esperado. Somos eu e o caminho sob meus pés, e o sentido logo em frente - quase ao alcance das mãos. Somos eu e só, correndo colina acima, esperando pela chuva que faça isso tudo desmoronar - esperando pela chance de ter algo em que acreditar outra vez. Eu e meus medos, me encarando de volta. Almas perdidas - envelhecidas, doloridas, solitárias.

- Danielle Bernardi

terça-feira, 7 de abril de 2009

Travesseiro de Penas.

Tem alguma coisa errada. Não era para ser assim...
Tem alguma coisa faltando. Cansei de mim.
O sono e a falta se confundem, se tropeçam, fermentam... Fazendo os limites de um parecerem o sonho de outro. E é sempre assim. Sem jeito, sem trejeito, meu tipo de insolução favorita. E neologismos a parte, tudo é invenção mesmo, é não enxergar fim, não enxergar começo. É estar certo da tempestade chegando e virar as costas para maré. Jogue tudo isso fora... É culpa do sono, da falta. Da noite que acaba e começa num mesmo ponto. Cansei de mim. Quero minha noite sem sonhos só pra fingir que tudo continua bem amanhã, quero a bagunça de lençóis e cobertores como a carícia dolorosa que a falta faz. Não era para ser assim... E a neblina parece tanta que às vezes me esqueço de como era para ser, e me confundo, e troco tudo. Passado de cartas trocadas, baralho na mesa, coringas guardados. Tem alguma coisa faltando. E um enorme elefante na sala - de lembrete. E o sono não diminui nada disso, só dá voltas no mesmo lugar, tentando achar conforto ao redor desse buraco. E a falta - insone - consome, maltrata. Os pensamentos já não se juntam como deviam, e depois de seis minutos sempre haverão mais seis da mesma canção. Mas o repeat desses dias já está gasto. Perdeu cor, perdeu forma, perdeu tudo. E continua travado no mesmo lugar. Tem alguma coisa errada. Alguma coisa não, porção de coisas. Mas é tudo sono, sonho, delírio, loucura. É tudo vírgulas e pontos. É sempre assim. E a falta - insone - consome, maltrata.

- Danielle Bernardi

sábado, 4 de abril de 2009

Faíscas na Estação.

Pegue o trem partindo, antes do amanhecer. Veja a neblina se dissolver em dia, através da janela. Encoste a cabeça no vidro, olhe o horizonte, e peça para que a viagem não tenha fim. Sente-se comigo. Compartilharemos o silêncio eloqüente que nos deixa nus. Sentaremos frente a frente, olhando para nossos reflexos na janela, com todos os pensamentos a milhas e milhas por hora. Consegue sentir? É aquilo tudo crescendo de novo. Com faíscas de luzes, nossas vidas a nossa frente. Depois vá, e me deixe. Mas pegue o trem partindo outra vez, faça a viagem sozinho, sem saber pra onde está indo. E quando todo o sentimento parecer sem nome, deite a cabeça no encosto, perca alguns segundos olhando através do céu. Esqueça todos lá fora, deixe a bagagem na estação e quando sentir frio coloque as mãos nos bolsos. Suspire bem fundo, mas não diga nada. Para onde o trem está indo você não precisa de palavras. Deixe a nostalgia correr, pense em tudo o que se foi e naquilo o que não voltará. Abrace os joelhos, se houver dor. Dispa-se do compromisso de deixar os pensamentos pra depois. A viagem é longa e os fantasmas ainda estarão lá, te esperando na estação. Encoste a cabeça no vidro, esqueça o compasso do coração. Nenhuma palavra será dita, apenas deixe os olhos distantes, no horizonte, no caminho sem destino.
- Danielle Bernardi

sexta-feira, 3 de abril de 2009

Nada Dura - Para Sempre.

Inquieta. Com uma ansiedade sem razão revirando seu estômago. Toda a noite era a mesma coisa. A mesma repetição de um querer e um não-querer ao mesmo tempo, tempo que devia passar, tempo que devia parar. E aquele não-saber angustiado, o não-definir sentimento, nome, situação. Era o escuro da noite lá fora. Eram milhares de músicas que nunca se encaixavam. Era a palavra como a fuga e a fuga perdida no silêncio, e a ausência de si mesma presa em algum lugar. Era a música errada, a palavra esquecida, a ocasião passada. O não-tentar, nem chegar perto daquilo o que devia. E o dever de não-dever nada a ninguém ou coisa alguma. O não do verbo a tornando uma negação por completo, e a afirmativa é uma mentira, ilusão de fim de tarde que se apaga quando a escuridão chega. E antes que o momento fosse eterno, ele já teria partido, deixando buracos, faltas e falhas marcando a noite de hoje todo novo amanhã. E antes que fosse tarde já seria cedo demais pra começar tudo de novo. E nesse meio-tempo nada termina. São só começos repetidos, dejá vu de todo o dia, aos olhos de quem quiser ver. E quando o não-ser, o não-saber e o não-querer vão embora, fica ela lá, meio morta, meio perdida, procurando razão pra tudo aquilo e esperando uma nova dose, uma explosão de nãos de verbos no meio da monotonia. O não-sentido é o preço, mas é pouco quando no sentido não se vê graça. O não-tempo é o que incomoda, o não-hoje o não-agora. O nada-dura-para-sempre antes mesmo do começo. O não-tempo é o que mata, porque não é verbo, porque não é nada, e porque é tudo o mesmo tempo. E antes que fosse tarde já seria cedo demais pra começar tudo de novo. Não-tempo. Não-hoje. Não-agora. E fica ela lá, meio morta, meio perdida. Buracos, faltas e falhas marcando a noite de hoje todo o novo amanhã. Esperando uma nova dose... De nãos de verbos, de negações no espelho, e da sensação que há muito se fora, sem ficar tempo o bastante para ver as estrelas ou esperar a chuva.
- Danielle Bernardi

quinta-feira, 2 de abril de 2009

Água e Vinho. Fome e Pedaços.

Se houvesse uma só maneira de dizer isso tudo, eu a trancaria em algum lugar esquecido. De nada vale tudo isso se só houver uma caminho entre certo e errado. Prefiro o inventado. A tentativa é a verdadeira mensagem, é o grito mal contido que escapa pelas minhas mãos, procurando destino, procurando razão. Se só houver um por quê, prefiro não o saber, quero a dúvida como minha máxima principal, quero o quebra-cabeça se desenrolando peça por peça, sem promessa de fim. Não quero uma vida sem mistérios, sem dilemas, sem tons de cinza. Quero procurar o preto e o branco em todo o lugar, e bater de frente com verdades que eu achava certas e encontrar crenças definitivas. Quero a certeza de ser tudo o que posso, de ser o máximo de mim em cada coisa e em cada segundo. Quero a vida pois sou egoísta, quero vivê-la agora e quero um agora sem fim. Todos os meus quereres não são desculpa, não são falsas ambições, não são nada além daquilo que são. E os sentidos por trás de tudo, os motivos, a inconsciência do mundo, isso tudo se revela por vontade própria quando convém. Sou sincera o bastante para admitir meu egoísmo humano, teimosa o bastante por exercê-lo como direito e tola o bastante para querer a água e o vinho, a dor e a felicidade suprema. Sou toda fome e pedaços. Quem dera tudo o que digo fosse mera conversa, meias-palavras correndo por aí, mas é verdade – seja lá o que a verdade for. O caminho mais fácil é a mentira mais barata. Não se engane, escolher sempre o mais difícil é tolice, é a ilusão de que se é forte e bom o suficiente para enfrentar qualquer coisa, mas desde que o mundo é mundo, até Aquiles sucumbiu. O segredo é não ter segredo. Não ter receita, não ter fórmula, não ter limite. Um conselho importante é não aceitar a palavra de ninguém como definitiva, a palavra própria é a única que existe, o resto perece, se esquece. E só a tentativa é o grito. E num mundo de surdos só quem tem voz é quem tem alma. Água e vinho. Fome e pedaços.
- Danielle Bernardi