sábado, 5 de dezembro de 2009

Lata-Carne-Ferrugem.

Tenho a eloquência da chuva guardada do lado de dentro, o tamborilar das gotas em tetos de zinco que não cedem. E faço uso de meus sapatos vermelhos para percorrer o desbotado do que já foram tijolos amarelos, tentando reter na memória os traços do sonho que me pegou pelos dedos e me trouxe até aqui. Tenho a eloquência da chuva, do desabar solitário, gota à gota, de uma fonte torrencial. E o trovoar em meus ouvidos é composto por caixinhas de músicas que foram perdidas em algum lugar, com sua melancolia desenhada em acordes intrépidos: cavalheiros de nome covarde em busca do idílio. E que me condenem e me acusem o espírito, que me olhem com desagrado ao ouvir o rangido de minhas peças e riam de minha inabilidade crônica, que calem perante meu silêncio e sobreponham suas próprias palavras às minhas: que me desafiem. Me coloco de pé sobre o vento, e os convido à entrar, enquanto estiver de passagem. Tenho sempre o mesmo oco que se alarga e se oferece como forma de abrigo. E tenho a eloquência da chuva, e o tremular dos lábios: que devoram palavras. Precisa-se de um abridor de latas.
- Danielle Bernardi

Um comentário:

Carla disse...

Cada vez melhor
se ássim é possível.
Adoraria tê-las e lê-las em livro.
Nas mãos e com o cheirinho das páginas a mágia se completaria perfeitamente.

Bjocas.

Euzinha.